A
DIFÍCIL ARTE DE DOSAR CONTROLE E CUIDADO EM UMA RELAÇÃO AMOROSA
As crianças querem sempre saber onde a mãe está,
pois têm medo de perdê-la. Com o tempo, percebem que o amor é a garantia de que
não serão abandonadas; contudo mantêm,
em parte, a atitude controladora, agora por preocupação e afeto. No
relacionamento amoroso, a experiência se reproduz. O risco é permitir que o
zelo se transforme em fiscalização excessiva.
Precisamos nos voltar para a infância para entender
as forças em operação no psiquismo do adulto. Ao nascer, o bebê imagina a mãe
como parte de si e acredita que exerce controle absoluto sobre ela. Basta
chorar que a mãe aparece para suprir sua necessidade.
À medida que cresce, percebe que ela é independente
e nem sempre responde com presteza ou sequer atende às suas solicitações.
Desesperada, temendo perder a mãe, a criança busca recuperar o controle
refinando os procedimentos. Aos poucos, aprende quais ações são efetivas para
conseguir o que deseja. Se antes lançava mão só do choro, agora usa a culpa, a
amolação, a graciosidade, a chantagem emocional. Ao mesmo tempo, o afeto pela
genitora vai crescendo. A preocupação com seu bem-estar, tranqüilidade e saúde
ganha força. As perguntas “o que a mamãe está fazendo?”, “para onde ela foi?”,
“com quem ela está?” têm os componentes de controle e afeto, além dos de
curiosidade, aprendizado, identificação e certamente outros, mais sutis. Mas me
interessa falar das duas correntes psíquicas postas em evidência mais acima:
uma que deseja controlar e outra que deseja cuidar da mãe. A primeira está
ligada ao medo de não sobreviver sem sua presença; a segunda, ao amor por ela.
Ao amar a mãe, a criança sente-se amada. O controle começa a perder a razão de
ser: uma mãe amorosa não vai abandoná-la ou negligenciá-la. O próprio amor se
torna fator de segurança, dispensando o controle. Mas persiste o sentimento
primitivo de que é o controle que faz a mãe acudir e a mantém amarrada e
atenta.
Como somos herdeiros de nosso passado, nos mantemos
em parte no registro do controle e em parte no do zelo; sem esquecer o natural
desejo amoroso de participar de tudo que se refere ao amado e da curiosidade
sobre suas atividades.
Alguns adultos aceitam o controle e o considera,
como ao ciúme, uma prova de amor. Mas outros se sentem sufocados, presos e
ofendidos com o mínimo de indagações sobre suas atividades. Estes só percebem o
controle e não conseguem ver o aspecto de cuidado na atitude do outro. Desde que
não haja fatores complicadores, a necessidade de controle vai sendo lapidada
até se perder no amoroso desejo de acompanhar a vida do parceiro. O que persistir
poderá ser carinhosamente aceito, a não ser que se tenha criado, durante o desenvolvimento,
uma ojeriza pela atitude fiscalizadora. Em geral, negocia-se um certo encaixe
entre o medo de ser controlado de um e o desejo de controlar de outro. Se os
aspectos de zelo, do “querer saber” puderem ser percebidos e valorizados, e se
o casal está disposto a desenvolver a relação em direção a um equilíbrio, o
medo de ser controlado ou a idéia de que a falta de controle significa desamor
podem ser minimizados, permitindo uma convivência rica e gostosa.
Nahman Armony
Primeira publicação na revista CARAS.
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