WINNICOTT – O SELF E O EGO
 
 
                                    Anotações dispersas.

                                           Um estudo
 
 
 
Citação retirada do “Explorações Psicanalíticas”  parte 19, redigido em julho de 1964,  p.81:
         “Não é possível fornecer uma resposta direta à pergunta: o bebê possui um ego, desde o início? A razão para tal é que, de começo, o ego do bebê é, ao mesmo tempo, débil e poderoso. É débil ao extremo se não existe um meio ambiente facilitador satisfatório. Em quase todos os casos, contudo a mãe ou a figura materna fornecem apoio ao ego, e, se ela faz isso de modo suficientemente bom, o ego de bebê é muito forte e possui sua própria organização. A mãe é capaz de proporcionar este apoio ao ego mediante sua capacidade e disposição de identificar-se tempo rariamente com o seu bebê.
         É importante distinguir entre a capacidade que uma mãe tem de identificar-se com seu bebê, mantendo, naturalmente, sua própria autonomia, e o estado, próprio ao bebê, de não haver ainda emergido da dependência absoluta. É só gradualmente que ele separa o não-eu  do eu, e um estágio importante de desenvolvimento emocional ocorre quando o bebê torna-se capaz de reconhecer  o fato da dependência e conseguir ter um self que é apenas relativamente dependente – ao invés de absolutamente dependente – do estado temporário da mãe em que ela se conluia com o bebê, de maneira que este tem, por causa do conluio dela, um ego, uma organização do ego e um certo grau de força e elasticidade do ego. 
         Comentário: Creio que o self existe desde o início da vida como um impulso singular para o desenvolvimento e expansão. Seria uma espécie de id, só que à diferença desse, que é impessoal, teria uma especificidade, uma singularidade, uma ipseidade. Aquilo que Winnicott chama de núcleo do verdadeiro self seria o repositório dessa ipseidade. Esse núcleo é inabordável (creio que o incomunicável de Winnicott deva ser lido como inabordável, incorruptível). O self é pois impulsão para a vida, para a expansão, para a conquista de novos territórios. Já o ego refere-se ao aspecto do lidar com o ambiente de modo a nele sobreviver da melhor maneira possível. O ego tem uma filiação darwiniana (adaptação) e o self uma filiação nietzschiana (vontade de potência, expansão). Comentário 2: há portanto uma interpretação minha diferente do pensamento de Winnicott     
 
Do mesmo livro no. 8 IDÉIAS E DEFININIÇÕES: “O Self falso. O self verdadeiro – estes termos são utilizados na descrição de uma organização defensiva na qual se da uma, etc. [ o que eu entendo é que o falso self “é semelhante à função do Ego, voltado para o mundo, entre o Id e a realidade externa”. (p.36)
Winnicott diz: “Self verdadeiro ou fonte de impulsos pessoais” (p.36)
Winnicott fala de “self falso complacente” onde outros autores, diz ele, falam de Ego Observador(p.36). Concluo que o falso self aproxima-se conceitualmente do ego e o verdadeiro self do id. “A espontaneidade e o impulso real só podem provir do self verdadeiro e, para que isto aconteça, alguém precisa assumir as funções do self falso”(p.36) Todas as citações teriam sido escritas no começo  da década de 50, o que eu duvido. Qual a função do falso self? Defender o verdadeiro self. Defender a integridade. Defender o verdadeiro self das invasões externas. Parece uma função egóica, de preservação da personalidade, ou da individualidade.  
 
 
 
HOJE, NO DIA 25/10/99 PENSO O SEGUINTE:
         Podemos inventar um self potencial e um self consciente de si mesmo. Haveria um self desde um teórico início intra-uterino; seria o impulso à vida, que inclui o crescimento, a diferenciação e integração célular, formação dos tecidos, seria o impulso à realização, ao crescimento, à expansão que evidentemente dependem de um ambiente suficientemente bom, mas também dependem da potencialidade do bebê. Em “Recordações do nascimento, trauma do nascimento e ansiedade” de 1949 (Livro: “Da Pediatria à Psicanálise Winnicott fala de um self existente em ato antes do nascimento(p .235). Mais adiante parece falar de um self potencial que precede o self consciente de si mesmo.
         De qualquer forma este self, no seu caminho de expansão, precisa inventar funções que o ajudem a lidar com a realidade sem que ele perca o impulso de expansão. O self então inventa a função egóica, a função superegóica, etc. 
 
  • Podemos igualar o self ao potencial hereditário em processo de maturação. Se não houver uma intrusão do ambiente esse potencial hereditário poderá processar-se dentro de uma continuidade de ser.
  • O self tem um aspecto pessoal que o id não tem. A fome seria um atributo do id enquanto que a maneira da fome se manifestar, diferente para cada criança, seria uma manifestação do self que de início estaria referido ao potencial hereditário em expansão mas que poderia ser modificado por ação do ambiente.
     
     
    22- Do livro “O Brincar e a Realidade” capítulo V “A criatividade e suas origens”: “2- Examinei os elementos masculino e feminino artificialmente dissecados e descobri que associo por enquanto o impulso relacionado a objetos (e também a voz passiva disso) ao elemento masculino, enquanto postulo que a característica do elemento feminino no contexto da relação de objeto é a identidade, concedendo à criança base para ser, e depois, mais tarde, uma base para o sentimento do eu (self). Acredito que é aqui, na dependência absoluta da provisão materna, daquela qualidade especial pela qual a mãe atende, ou deixa de atender ao funcioname nto mais primitivo do elemento feminino, que podemos buscar o fundamento da experiência de ser”(p.120).
     
    Do livro “Da Pediatria à Psicanálise”. Artigo: “Aspectos clínicos e metapsicológicos da regressão dentro  do setting psicanalítico” : “Ao se recuperar da regressão, o paciente, com o self agora mais completamente rendido ao ego, necessita da análise comum...”(p.480).
     
    Do artigo “Relação paterno-infantil” do livro “O ambiente e os processos de maturação”: “...como eventualmente o ego do lactente se torna livre do apoio do mãe, de modo que o lactente alcança uma separação mental da mãe, isto é, uma diferenciação em um self pessoal  e separado”(p.41). Comentário: isso pode significar que o self primitivamente não é um self pessoal, mas um self que se junta, que  se mistura ao self da mãe.  A força vital viria da soma dos dois selves. Podemos  pensar que  isso ocorre na fase de fusão; o aquisição do self separado da mãe, do self pessoal iniciar-se-ia na fase de dependência relativa.
     
Pode-se pensar, a partir dessa perspectiva, que o self tem um impulso ao crescimento, à diferenciação e à integração. Este impulso para o crescimento, que mais tarde poderá ser denominado de impulso à expansão, à realização de suas potencialidade, é chamado por Winnicott de força vital. Essa concepção está aparentada ao élan vital de Bergson e, para mim, mais fortemente, à vontade de potência de Nietzsche.    
 
. O ego é uma parte do self, ou uma função do self, que existe para possibilitar o pleno desenvolvimento do self. O ego lida com a realidade externa, com os instintos e com o superego aplainando o caminho de auto-realização do self. O self ( um de seus significados) é impulso de vida, vitalidade, vontade de potência, realização, expansão. O ego tem a função de possibilitar a expansão do self. Pode ser bem sucedido  ou mal-sucedido. Em geral, algo se perde na caminhada do self em direção à sua plena realização. 
 
. Desenvolve-se o falso self como uma reação à invasão. O verdadeiro self se recolhe e o falso self torna-se o centro de gravidade da personalidade. Esse falso self pode reagir à intrusão de duas maneiras: 1- tornando-se submisso e 2- tornando-se desafiador. No pólo submisso aparece o sentimento de vazio, tédio, futilidade. No pólo desafiador a pessoa enquanto desafiando, brigando, competindo não tem o sentimento de futilidade que porém surge quando não há uma boa briga em vista. Nos dois casos é possível que a pessoa venha a se distinguir profissionalmente.
 
. O self é tudo o que a pessoa é: seu corpo, suas fantasias, seu ego, seu id, seu superego, sua necessidade de crescimento, integração, realização e expansão. Visualizo o self como um fluido que tem a capacidade de banhar todos as partes da pessoa. Um fluido que pode se concentrar em qualquer das partes da pessoa. Já pensei que o falso self seria o ego, mas prefiro, no momento pensar que self é um todo do qual o ego é uma parte, e que o falso self é um derivado do verdadeiro self que se desenvolve devido aos problemas com que o self se defronta.
 
. Do livro “O ambiente e os processos de maturação”, artigo “Distorção do ego em termos de falso e verdadeiro self (1960): “Particularmente relaciono o que divido em self verdadeiro e falso com a divisão de Freud do self em uma parte que é central e controlada pelos instintos (ou pelo que Freud chamou sexualidade, pré-genital e genital), e a parte orientada para o exterior  e relacionada com o mundo” (p.128).
                                            
                                                           Nahman Armony




 
 
 
 
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