ACEITANDO AS MANIFESTAÇÕES INCONSCIENTES

                            
        Embora o inconsciente dinâmico tenha sido apresentado ao mundo por Freud nos fins do século 19, e apesar de ter-se firmado, em nível intelectual, como uma realidade indiscutível, ainda não foi assimilado como uma verdade que toca pessoalmente a cada um. Acreditamos mais no inconsciente do outro do que no nosso. Em linguagem popular: a ficha ainda está caindo mas não chegou lá. Temos dificuldade de admitir e aceitar que nossos atos possam ser manifestações da força do inconsciente. E, no que diz respeito às relações amorosas, esses atos certamente aparecerão em algum momento diante de situações ou conflitivas, ou frustradoras, ou decepcionantes, ou outras de matiz negativo.
        Para que um casal possa se manter unido é necessário que o parceiro seja aceito com suas qualidades e defeitos, com suas semelhanças e diferenças. Parte do processo de aceitação se dá no plano verbal consciente através da inibição de reclamações. Aqui eu me refiro a questões menores --- substitutas de questões maiores --- tais como a maneira de manejar o tubo da pasta de dentes, a reação diante de uma colocação de um objeto fora do lugar habitual, uma enunciação inconscientemente provocativa, e, de uma maneira geral, de uma desatenção quanto a antigos e estimados hábitos do parceiro. Segurar o protesto adiando-o para um momento propício favorece o estabelecimento de um diálogo educado, civilizado, ameno. Mas para que esta situação aconteça de forma produtiva é preciso que esteja presente a ideia de Inconsciente. A pessoa provocativa terá acumulado raivas que fazem pressão para se manifestar. E elas se manifestam mediante pequenos atos irritantes muitas vezes realizados inconscientemente. Esses atos se não forem percebidos pelo parceiro ou se forem por ele desconsiderados restabelecerão o equilíbrio da relação até então ameaçado por um excesso de ressentimento não expresso que se esvazia com as pequenas retaliações já citadas. Se percebidos podem tomar dois caminhos: ou o consorte reage imediatamente correndo o risco de um grande desentendimento ou retém seu desconforto e aguarda uma ocasião favorável para um diálogo. Aqui são também possíveis dois caminhos. Ou a ideia de Inconsciente está presente ou não. No segundo caso a pessoa que sofreu a provocação, em tendo como referência a figura de Vontade Consciente, usará um tom acusatório fazendo com que o parceiro se sinta ao mesmo tempo injustiçado e culpado (ele ou ela não queria fazer aquilo). Ameaçado em sua autoestima o parceiro se defende de todas as formas possíveis podendo resultar daí uma séria altercação. Se porém sua referência for a ideia de  Inconsciente, saberá que o consorte não teve o propósito de realizar aquele ato e se sentirá menos atingido em seu sentimento de não ser amado e de não ser levado em consideração. O diálogo pode tornar-se esclarecedor e unir mais o casal.
A noção de Inconsciente é, portanto muito importante na relação de casal, pois permite relevar um ato inconsciente desmerecedor. Ao mesmo tempo os atos inconscientes provocativos revelam a existência de sentimentos negativos na relação. É preciso então aceitar como natural, universal e inevitável não só a existência do inconsciente como também a ambivalência na relação amorosa. Os sentimentos positivos predominam, mas é impossível não existirem também sentimentos negativos. Se o casal sabe disto e está empenhado em construir e preservar uma relação, deixará passar os pequenos tropeços inconscientes sem fazer deles cavalos de batalha.
                                                               Nahman Armony       
                   Primeira publicação na revista CARAS
         

   

Nenhum comentário:

Postar um comentário