Vou-me
aventurar nas águas da filosofia sabendo de antemão a minha incompetência
diante daqueles que se dedicam à área. Sou um amador interessado por gosto e
por necessidade, pois a filosofia me ajuda na lide diária profissional e pessoal.
A minha questão é conservar o ideia de devir, pois como diz o filósofo
Heráclito "ninguém se banha duas vezes no mesmo rio", mas evitando o
sentimento de despersonalização, de morte do self, de perda do passado. Se tudo
flui, o que ficou para trás, o que é passado não existe e ficamos sem memória e
sem self. Então como conservar a memória e o self? Consigo pensar em duas
maneiras: na medida em que vivemos os momentos presentes forma-se uma esteira
de passado e se queremos nos reconhecer temos de procurar nesta esteira a nossa
identidade.Uma memória transcendente. Ou, como proponho, a vida flui sem deixar
esteiras e o passado mantém-se vivo
interagindo com os acontecimentos presentes na medida em que eles vão
acontecendo. Estaríamos diante de um passado e uma memória imanentes. Não temos
de parar a vida para buscar lembranças que ficam em uma região transcendente do
passado, pois o passado está imanentemente e inextricavelmente incorporado ao
presente com ele interagindo. O conceitos de SER E DEVIR existem desde a Grécia
antiga. Heráclito discursava sobre o devir e Parmênides sobre o ser. A questão
era: como as coisas se transformavam sem perder a sua essência? Durante muitos
séculos e até hoje SER e DEVIR se confrontam. Como conciliá-los? Nietzsche resolveu
lindamente a questão dizendo que o SER era
o DEVIR. Mas acho que isso não é suficiente para a minha disciplina, a
psicanálise. Se não tenho SER nada sou. Na medida em que as coisas acontecem e
se tornam passado elas desaparecem. A imagem que me vem é que a esteira dos
acontecimentos desaparece dispersando-se como areia ao vento. Mas se não estou
em devir eu não me transformo; na verdade não vivo, sou estátua morta.
Necessito do SER e do DEVIR. Creio que, numa inspiração bergsoniana, pensei que
o passado não é um passado de depósito, transcendente, mas um passado que está
em constante interação com os acontecimentos presentes. Deixa de ser uma
esteira onde vamos buscar nossas memórias e passa a ser parte do presente, uma
memória do presente. Quando um analisando fala alguma coisa lá está todo o seu
passado e seu presente. Se eu analista for ativamente atrás de acontecimentos
passados para entender o presente, estarei saindo do DEVIR e me imobilizando no
SER. O passado encontra-se no presente e não no passado. O SER está incorporado
ao DEVIR. Para isso é necessário que o DEVIR tenha uma espessura, que não seja
apenas uma linha onde só caberiam acontecimentos evanescentes. sem lastro. Esta
é a concepção que me serve para meu trabalho clínico.
Nahman
Armony
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