EM DEFESA DE UM ROMANTISMO CONSCIENTE



         A ânsia de juntar dois corpos para transformá-lo em um só existe desde tempos imemoriais e é algo que se mantém presente na alma humana. Vemos esse desejo aparecer em todas as idades. Mas, diferentemente do passado, é um desejo sujeito a críticas.  Antigamente acreditava-se nessa possibilidade o que ficava expresso no discurso religioso do casamento cristão, no “e viveram felizes para sempre” dos contos de fadas que deram vários filhotes em livros e filmes holywoodianos. Nas décadas e séculos que nos precederam éramos mais ingênuos e acreditávamos que nosso desejo de fusão com o parceiro ideal se realizaria. Perdemos a ingenuidade, mas o desejo não desapareceu. Ele continua firme e forte a nos guiar, direcionar, atormentar. A diferença é que já não acreditamos na possibilidade de sua realização. Mas, especialmente quando se é jovem e ainda não se passou por muitas decepções, desacreditamos acreditando. Tal milagre pode não ter acontecido com ninguém de nossas relações, com ninguém que conhecemos, mas somos diferentes e irá acontecer conosco. E aqui podemos evocar uma linda frase do poeta Vinicius de Moraes, frase que para os casais predispostos a acreditar em um relacionamento especial, único e eterno pode, na sua ambigüidade ser entendido como o ideal de amor romântico. Diz ele “que o amor seja infinito enquanto dure”. O infinito pode ter o sentido de eterno, pois o infinito justamente por não ter fim evoca o para sempre. Mas também pode significar um mergulho na alma infinita de cada um, sem que obrigatoriamente este infinito torne a relação eterna. Existe uma tendência de recitar o verso citado como “que seja eterno enquanto dure”. Isto fala da ambivalência das pessoas em relação  ao desejo primordial de um amor eterno, especial, insubstituível. No fundo da alma ainda mais que a esperança, existe a certeza de que encontramos ou encontraremos nossa alma gêmea que nos acompanhará para o resto da vida. Num primeiro momento poderemos achar absurda a permanência mesmo que latente desta crença. Mas se pensarmos melhor verificaremos que quando se tem esta utopia o casal apresenta um maior empenho em superar as dificuldades que surgem no caminho da realização amorosa. Quando o casal já começa a idéia de impermanência muito mais facilmente a relação se desfaz. O que também não é de se desprezar. Freqüentemente encontramos situações de três casamentos sucessivos em que finalmente o terceiro tornou-se estável: isto tanto pode ser explicado pelo desaparecimento do ímpeto juvenil, por um certo cansaço, como também por um amadurecimento que permite ao mesmo tempo manter no inconsciente a idéia de  união eterna enquanto o consciente aprende a lidar com as diferenças de personalidade e com as crise. Também podemos pensar que a ilusão de completude se desfez nos casamentos anteriores mas permaneceu o desejo de ter uma companhia amorosa o que faz com que o casal suporte melhor as vicissitudes de uma relação. Isso sem deixar de levar em consideração de que a experiência pode levar a melhores escolhas. Portanto, amigos, não desistamos. Vamos manter a ilusão de completude sim, mesmo sabendo que ela é falsa, pois ela nos ajudará a manter uma relação estável, o que, segundo as pesquisas de saúde, aumenta a longevidade e a qualidade de vida.

                                                        Nahman Armony

Primeira publicação na revista CARAS     

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