FLUTUAÇÕES NO AMOR


                             
        O Homem deseja ao mesmo tempo estabilidade e aventura. Nas sagas dos heróis há um período de aventuras que exige força, habilidade para enfrentar os perigos do inesperado e depois de tudo, o herói é recompensado com uma vida tranqüila ao lado de seus entes queridos. Para muitos de nós estas histórias satisfazem o nosso desejo de aventura. Lemos estes mitos no conforto de nossos lares, na nossa poltrona preferida ou em nossa cama aconchegante. Enquanto o herói enfrenta perigos terríveis nós também os enfrentamos, porém na segurança de nossas casas. Muitas vezes nosso desejo de aventura se aplaca vicariamente nessas leituras; mas não sempre. Premidos pela nossa curiosidade e pela nossa insatisfação com a monotonia e rotina da vida procuramos “sarna para nos coçar” como diriam nossos sábios e aposentados avós. Mas, sem dúvida o desejo de estabilidade permanece. Uma estabilidade que se mostra cada vez mais problemática. Hoje tudo se move. Karl Marx já dizia que “tudo o que é sólido se desmancha no ar”. De um universo estático da Idade Média quando o homem tinha o conforto da previsibilidade inclusive no após a morte, passo a passo chegamos a um mundo em perene movimento em todos os seus recantos. Lemos no último livro de Mario Novello “Do Big Bang ao Universo Eterno” que um dos últimos redutos que ainda pensávamos como estático ----- o Universo ------  é atualmente visto como dinâmico e histórico. Tudo se agita. E, no entanto, continuamos precisando tanto de estabilidade quanto de instabilidade. O leitor de aventuras está estável no seu canto lendo o seu livro e ao mesmo tempo instável identificando-se com o herói da estória. O soldado na frente de batalha está dentro de um cenário convulso com bombas ameaçando explodir seu acampamento e neste panorama de absoluta instabilidade ele busca estabilidade na fotografia da amada que de tempos em tempos contempla e beija para se assegurar de que existe um corpo e uma alma que para sempre o acolherão.
        Para duas pessoas apaixonadas a estabilidade existe na forma de ininterrupção. Eles desejam estar e estão sempre que podem juntos. E isto para eles é o amor. Só têm olhos um para o outro e nada que não seja a sua própria paixão os distrai. Porém mais cedo ou mais tarde a paixão dá lugar a um sentimento mais tranqüilo que permite agora que se olhe para os lados, para fora da relação apaixonada. A pessoa que estava inteiramente perdida dentro da outra retoma a sua individualidade e ao fazê-lo vive processos e sentimentos que permaneceram latentes durante o período de paixão. Seu amor pelo parceiro mesmo que sólido e incontestável não se traduz mais em um comportamento inteiramente dedicado a ele. Agora existem aproximações e afastamentos, flutuações de intensidade e de qualidade, sentimentos paradoxais, ambivalências, fantasias várias, curiosidades que fazem olhar para além da relação. Isto pode acontecer em tempos diferentes para cada um. E aquele que continua perdidamente apaixonado não entende que o parceiro deixe de ter olhos só para o casal. A idéia é de que não é mais amado o que se torna fonte de mal-entendidos. É importante que a pessoa possa se colocar no lugar da outra para entender o que está acontecendo com ela. Pedir isto a um apaixonado é quase uma perda de tempo, pois dificilmente de dentro de sua paixão ele poderá compreender a subjetividade do outro. E, no entanto em nome de um amor promissor será preciso fazer um esforço. Esforço que mais facilmente virá daquele que já passou o período de paixão absoluta e que deverá compreender e acolher a incompreensão do parceiro, sem se revoltar com o que poderá ser sentido como tentativa de controle e dominação. Talvez valha mais a pena este esforço do que simplesmente se afastar de uma relação amorosa promissora.
                                                    Nahman Armony                                       

                                                                                      

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