COMPETIR X COMPREENDER


                                              

         Este texto está mais dirigido para jovens que justo por este privilégio provisório não tiveram tempo de consolidar sua autoestima e seu sentimento de identidade adulta o que eventualmente virá a acontecer quando, no futuro, realizarem-se profissionalmente obtendo o reconhecimento de seus pares, integrarem-se na comunidade, e ganharem um sentimento de competência ao aprender a lidar prática e psicologicamente com fracassos ocasionais.
Por enquanto, encontram-se vulneráveis, precisando defender uma autoestima e identidade adulta ainda em formação. Isto complica suas relações interpessoais em geral e especialmente as amorosas. Uma simples discordância poderá ser vivida como rejeição indo além da questão objetiva e atingindo profundos sentimentos inconscientes. “Se você não concorda comigo é porque não me ama, não me valoriza, não me reconhece”, diria o inconsciente da pessoa. Sem dúvida há aí um complicador que vale a pena ser mencionado. Casais jovens têm uma tendência inconsciente a fantasiar uma relação perfeita, sem nenhuma discrepância: um parceiro-espelho que pense e sinta exatamente igual. Aqui ultrapassamos a questão da autoestima e da identidade para ingressarmos na fantasia ancestral do ser completo.
         A autoestima e o sentimento de identidade frágeis exigem defesas que aparecem nas relações amorosas como competição e luta pelo poder. A pessoa tem medo de mostrar seu desejo, sua necessidade do outro, suas carências, pois acha que isto o colocará em posição inferior e a mercê do outro, sem poder se defender quando atacado.
         Um modo de eliminar o perigo representado pelo parceiro é controlá-lo por completo, obrigando-o a agir conforme o desejado e monitorando todos seus passos. Abole-se sua autonomia e neutraliza-se sua periculosidade tornando-o um escravo obediente e solícito. A ameaça aqui não está referida apenas à autoestima e identidade. Tem a ver também com o medo de abandono. Uma pessoa controlada jamais poderá deixar a relação. A idéia é a de que ela permanece na relação não por amor, mas por um controle onipotente.
         O jovem ainda inseguro de sua identidade adulta poderá afivelar uma máscara de perfeição esperando que o escolhido para cúmplice amoroso o auxilie a mantê-la no lugar; uma observação que aponte para uma falha, um erro ou uma diferença poderá ser sentida como uma traição da função asseguradora atribuída ao parceiro.
         Estas dinâmicas formam-se nas relações primitivas com figuras significativas (pai, mãe, família, etc.) e condicionam a entrada da pessoa no mundo adulto. Alguns felizardos chegarão à maturidade fácil e rapidamente enquanto que outros, atrapalhados por seus fantasmas infantis, terão mais ou menos dificuldades em fazê-lo. A aquisição de uma identidade adulta, referida à luta por um lugar no social é mais um fator de superação dos obstáculos psíquicos que inevitavelmente adquirimos ao longo de nosso desenvolvimento.
         Quanto mais próximos estivermos da maturidade mais transformaremos a relação de competição em relação de compreensão. Quanto mais deixarmos de nos preocupar com a preservação de nossa autoestima, mais livres estaremos para perceber a subjetividade do parceiro e mais prontos estaremos para compreendê-lo.
         O caminho que vai da competição à compreensão exige um esforço psíquico que se apoiará no amor pelo consorte e na importância deste amor para a vida de cada um.
É preciso apostar no futuro, na capacidade de autorrealização que trará uma maior consistência pessoal. Entrementes será preciso sentir que o esforço em abrir mão da susceptibilidade narcísica trocando-a por uma compreensão da subjetividade do outro é, a médio ou longo prazo, recompensador. “Agüentem o tranco que vale a pena” é o que tenho a dizer para jovens de todas as idades.  
          
            
                                               Nahman Armony

Primeira publicação na revista CARAS
        
        

          

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