Trajetórias do tempo. 

Estamos em um período de transição. Tudo é questionável, modificável. Enquanto as gerações mais jovens têm maior facilidade em se adaptar, as mais velhas veem-se diante de obstáculos difíceis de ultrapassar. Assim é com a semi-abstração ‘TEMPO’. Na atualidade o nosso primeiro tempo ainda é o de brincar. Ao brincar o tempo desaparece; deixa de existir como tempo e passa a existir como prazer, como ilha encantada, como paraíso.
No segundo tempo quebra-se a uniformidade e a continuidade do tempo. Esse segundo tempo é o do dever, da obrigação. É quando o tempo faz a sua aparição.
Será então preciso começar a nele pensar e, mais tarde a nele se preocupar. Os primeiros contatos e contratos com os futuros tufões temporais serão benignos. São apenas chuviscos refrescantes. É dada à pessoa um tempo razoável, apropriado à velocidade singular humana, para terminar ou pontuar alguma tarefa. O tempo permanece tranquilo. Não é preciso correr mais que o tempo para realizar a tarefa, pois há uma adequação entre tempo e realização. Vários fatores porém quebram este equilíbrio: certas tarefas só podem ser realizadas se a velocidade de feitura ultrapassar o tempo de brincar – o tempo descompromissado e por isso mesmo não existente. Quando vemos a humanidade disputando os 100 m. ou 1000 m. com obstáculos percebemos que estamos tentando correr mais rápido que o tempo, exigindo uma modificação da velocidade dos tecidos e dos líquidos corporais que lutam pela singularidade da pessoa. Por algum tempo o organismo mantém o seu ritmo, mas, finalmente cede à força da cultura, da mentalidade reinante, não conseguindo resistir. Temos agora mais um robô, um boneco sem vontade que tentará obedecer o ritmo imposto pelo social que de inicio se insinua parecendo poder ser controlado e finalmente passa a ser uma força poderosa de seu pensamento e comportamento.  Tudo isso se passa de uma subjetividade social que força a barra para um comportamento acelerado, acima do limite temporal. Exigimos então que o tempo corra mais depressa. Vemos então multidões se atropelando para não perder o tempo e sua posição social. O tempo urge e ruge como um leão raivoso e aqueles que não abrem mão de sua singularidade, atrasam-se em relação ao tempo que lhes é dado pela Sociedade, pelo Estado e pelos Costumes.  O Ser Humano ruge como leão e debate-se como um touro, para se manter precariamente na cacunda do touro, a espera de tempos mais acordes com as capacidades humanas de tarefas e fruições. Ao ser forçado a participar da correria o ser humano que tem o seu tempo próprio e que dele não abre mão, vai-se atrasando em relação ao tempo que lhe é dado pelo Estado e pela Sociedade. Preserva o seu tempo, mas perde o seu lugar.. Começa então a se forçar a correr. Por enquanto a pressa não é coisa dele: é coisa dos costumes. Ele tem seu tempo, a sociedade tem outro tempo e tudo estaria bem se não houvesse prazos para o cumprimento de obrigações. Torna-se cada vez mais difícil manter o tempo pessoal autêntico. A pessoa passa a transferir a pressa não à tarefa, mas ao corpo próprio incorporando a pressa ao organismo. Temos agora um tempo acelerado interno. A velocidade maquínica impôs-se e agora as pessoas correm mesmo quando isso não é necessário. A velocidade torna-se interna e a aflição de ‘chegar lá’ já não depende do ambiente externo; depende do próprio funcionamento de órgãos que trabalham febrilmente. Não é uma pressa com objetivo. É agora uma pressa estrutural. Antes era: devo correr para entregar em tempo o trabalho. Com o tempo a frase muda para “Devo correr para poder viver nessa sociedade.” O resultado disso são ansiedades, depressões, distúrbios psicossomáticos, e outros incômodos e sofrimentos.

                                                     Nahman Armony    



    


    



                                                     




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