5- P0STURAS TERAPÊUTICAS NA PRÁTICA CLÍNICA

A POSTURA SIMBIONTE - COMPORTAMENTO COVIVENCIAL

 
        A intenção já expressa e realizada por Mme. Sechehaye de possibilitar ao paciente experiências que colmatem as falhas oriundas de relações mãe-filho primitivas inadequadas aparece em sua máxima intensidade no trabalho teórico-prático de Harold Searles, consubstanciada na expressão 'simbiose terapêutica'. Passamos aqui da postura-continente à postura-simbionte. "Pelo fato do paciente esquizofrênico não ter experimentado, em sua infância, o estabelecimento e a posterior emersão de uma sadia relação simbiótica com sua mãe, tal como cada ser humano necessita para a formação de um núcleo sadio na estrutura de sua personalidade, na evolução da relação transferencial com o seu terapeuta, ele poderá eventualmente conseguir estabelecer este modo de relação."(Searles, 1965, p.338-9). Por isso mesmo o terapeuta deverá permitir-lhe ter "uma verdadeira espécie de relação amorosa mãe-filho, a qual oferece ao paciente seu único caminho de salvação de sua doença. (Searles, 1965, p.379). O terapeuta não se impõe tal comportamento, mas vive, espontaneamente, com todo o seu ser, uma verdadeira simbiose. "Não é demais dizer que, em resposta à transferência do paciente esquizofrênico, o terapeuta não só se comporta como os adultos significativos da infância do paciente, mas experimenta muito intimamente, dentro de si próprio, ativada pela transferência do paciente, a verdadeira espécie de profundos e intensos sentimentos conflitivos que estavam em jogo, embora reprimidos, nos adultos do passado, assim como experimenta, através dos mecanismos de projeção e introjeção na relação entre si próprio e o paciente, as intensas e conflituosas emoções que formaram a base seminal da psicose na criança, anos antes."(Searles, 1965, p.522). Então, a simbiose terapêutica refere-se a "uma forma de relação que tem a mesma qualidade daquela que embebe a relação mãe-filho na infância normal e na mais precoce meninice. Qualquer assim chamada individuação que ocorra no paciente e que não se funda numa fase relativamente clara de simbiose terapêutica é uma pseudo-individuação, e somente um arremedo de sanidade..."(Searles, 1976, p.401).
        Winnicott, Balint e Searles são terapeutas representativos do comportamento covivencial. Os dois primeiros empenham-se em manter um setting adequado para o desenvolvimento do cliente; o campo de atuação preferencial, na minha opinião, seriam os borderlines, especialmente na modalidade narcísica. Searles necessita de uma conduta terapêutica mais radical para tratar de seus pacientes psicóticos; realiza então a simbiose terapêutica. Aqui já não se trata de um manejo adequado do setting em uma situação regredida, nem de tolerância com relações primitivas. Trata-se de o terapeuta participar com seus fantasmas e com o seu eu real- objetivo, da relação. A distância terapeuta-cliente praticamente desaparece. Ambos estão igualmente envolvidos numa relação fantasmática-real. "...e eu sugiro que uma segunda e igualmente saudável fonte de sentimentos partilhados pelo terapeuta é o gradual desenvolvimento de uma relação real, a qual tem seu próprio curso relacionado e paralelo, porém não inteiramente abrangido pelo gradual desenvolvimento da relação transferencial através do trabalho conjunto."(Searle, p.378). Evidentemente, o terapeuta continua sendo o guardião dos objetivos terapêuticos da relação.
        Ainda uma observação antes de partirmos para mais uma revisão esclarecedora do comportamento covivencial: todos os três autores concordam que, em uma mesma terapia, possam e devam ocorrer mudanças na postura e no comportamento, segundo as necessidades do cliente. A impossibilidade de obter resultados com o comportamento interpretativo induziu alguns analistas a buscar técnicas alternativas. Estas, dialeticamente, proporcionaram e apoiaram pesquisas referentes às fases primitivas do desenvolvimento do ser humano. Como resultado destas investigações pode-se, simplificadamente, estabelecer a seguinte equação: 'neurose está para conflito assim como psicose está para falta/falta'. "Portanto, com borderlines e psicóticos o terapeuta se orienta no sentido de lidar, não só com conflitos, mas também, prioritariamente ou exclusivamente, com falhas/falta. As falhas do desenvolvimento provocam distúrbios na área da identificação/identidade. O comportamento covivencial, fornecendo um clima simbiótico primitivo para a díade, viabiliza as identificações primarias, dando a oportunidade de serem incorporados ao psiquismo vários aspectos da relação terapêutica, atenuando-se, destarte, a sensação de dispersão e inconsistência que o paciente tem. As imagos perturbadoras, incrustradas no mais fundo do psiquismo do cliente, incapazes de lhe proporcionar serenidade e conforto, sofrem uma transformação benigna, proporcionando ou aumentando o sentimento de segurança e confiança básica; novas pautas de relação intersubjetiva e interpessoal são internalizadas; capacidades psíquicas potenciais inativas atualizam-se e passam a exercer os seus efeitos; experiências fundamentais e estruturadoras que até então não tinham sido convenientemente vividas, são experimentadas com o terapeuta.
                                               
                               

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