A questão de quem costuma procurar quem, aparece freqüentemente
na relação entre namorados -- e, na maior parte das vezes, esconde uma disputa
de poder. Se eu procuro, então preciso dela (ou dele) e, assim sendo, ficarei
em posição de inferioridade para discutir o estilo de vida e os valores do
casal e terei de ceder mais que o outro.
Todos desejamos ter poder, pois isso nos dá uma sensação de
segurança, de sermos intocáveis e podermos impor nosso modo de vida. Estar em
uma posição superior, seja materialmente, seja psicologicamente, dá poder. E
nas relações amorosas o poder muitas vezes se manifesta em questões como “quem
precisa mais de quem”, “quem procura quem”. Os namorados seguram o impulso de
procurar o parceiro não só pelo medo de rejeição, mas por medo de ficar “por
baixo” e ter de ceder aos desejos do outro. “Ele tem de telefonar primeiro”,
“não vou procurá-lo”, fazem parte desta síndrome. Muitas vezes uma relação
promissora não vai adiante em função desse comportamento -- que pode ser
chamado de orgulho.
Numa relação saudável os parceiros deveriam sentir-se como
iguais e, em lugar de impor a sua vontade, negociar as diferenças, sabendo que
cada um terá de ceder um pouco, como em toda negociação. Na relação de poder,
sempre haverá um dominador e um submetido, mesmo que o casal não perceba a
situação. A pessoa dominada sentir-se-á desvalorizada e sofrerá com isso,
podendo vir a adoecer psíquica e fisicamente o que recairá sobre o dominador,
que terá um problema em suas mãos. Ou então o submetido, ressentido com a
situação, vingar-se-á de seu opressor de muitos modos sutis, podendo tornar a
vida do casal muito desagradável.
Como já foi dito, todos desejamos ter poder. Por vários motivos.
Um deles – e esse interessa particularmente à situação de casal – tem a ver com
a tendência a sermos influenciados. A afirmação dos valores próprios é uma
maneira de manter a identidade. Mas não basta. Sendo o ser humano sujeito a
influências, poderá não conseguir defender o seu modo de ser e de viver
adotando apenas uma atitude de suficiência. A imposição de nossos valores a
outros tem a ver (embora não só) com um velho ditado: “A melhor defesa é o
ataque”. Convencendo o outro e trazendo-o para o nosso campo, somos nós quem o
influenciamos e estamos, assim, a salvo de sua influência. Se não formos
proativos, corremos risco maior de sermos sugestionados. No casal, a questão
mais séria e assustadora é o medo de perder a personalidade. Ao trabalhar sobre
este medo, diminuindo-o ou neutralizando-o, evitam-se certas situações de
disputa. A questão de quem procura quem, então, deixa de ser um termômetro de
poder e passa a ser um sinal de interesse. Se eu o procuro é porque o amo e
espero que ele retribua meu amor procurando-me sempre que sentir falta de mim.
Estamos aí no registro da troca, da mutualidade, do amor, da confiança mútua, e
não no registro do orgulho, da teimosia, da competição, da luta por um poder
duvidoso.
Pela mesma razão, isto é, para não se enfraquecer diante do
companheiro, aspectos de nossa personalidade ou de nossa vida que poderiam
desvalorizar-nos são escondidos. O pretexto para tal atitude é o direito à
privacidade. Não há dúvida de que temos direito à privacidade, mas é preciso
entendê-la bem. Quando ela está a serviço da manutenção da superioridade
psicológica e do poder psicológico pode levar a uma relação afetiva
problemática. Pergunte-se: “Por que estou escondendo tal coisa dele ou dela?”
Se a resposta for: “Porque quero me manter poderoso”, algum trabalho psíquico
deverá ser realizado.
Nahman Armony
Primeira publicação na revista CARAS.
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