LUTO, MELANCOLIA E PSICOSSOMÁTICA



PRELIMINAR
Falarei dos diversos tipos de luto através de exemplos tirados da vida e do cinema (que é uma forma de apresentar a vida). Cada narrativa terá a sua especificidade, mas tentará ser compreendida pela construção teórica freudiana que encontramos em “Luto e Melancolia” e em “Introdução ao Narcisismo”. Por enquanto apresentarei apenas um dos conceitos metapsicológicos que  fazem parte de um complexo maior, ao qual terei de me  remeter mais adiante. Este conceito que será inicialmente usado eu o repetirei tal qual Freud o escreveu:
FRASE DE FREUD EM “SOBRE O NARCISISMO: UMA INTRODUÇÃO” VOL. 14 – “Ele  pode  ter  desviado inteiramente o seu interesse sexual dos seres  humanos; contudo pode tê-lo sublimado num interesse mais elevado pelo divino, pela natureza, ou pelo reino animal, sem que sua libido tenha sofrido introversão até suas fantasias ou retorno ao seu ego”(p.97). Por esta frase vemos que Freud admite a existência de uma zona egóica  (retorno ao  ego) e de uma zona de fantasia (introversão até as suas fantasias), o que se confirma em seus desenvolvimentos posteriores. Quando a libido retorna ao ego, o objeto desaparece, pois  torna-se parte  da  pessoa. Quando a libido retorna à fantasia o objeto pode ser alcançado pela consciência, pois sendo um objeto, é algo diferente de um si mesmo. O si mesmo, aquilo que foi incorporado ao ego, é muito mais difícil de ser percebido do que o objeto da fantasia. Essa é uma noção inserida em uma estrutura maior, mas que separei por ajudar na compreensão do se segue.

Tomemos agora  alguns exemplos da vida:

ELISA
1- Após a morte da mãe logo vestiu-se de azul por influência do filme “A liberdade é azul”, que muito a impressionou. EU LOGO PUS AZUL POR CAUSA DO FILME PORQUE ELE ME MARCOU MUITO QUANTO AO LUTO, O QUE PODE SER A PERDA DE ALGUÉM MUITO QUERIDO.

2- A mãe sofreu dois derrames e ficou longo tempo na cama praticamente inválida, tendo de ser atendida em praticamente todas as suas necessidades. QUANDO VOLTEI DO VELÓRIO TIVE MUITO MEDO DE ESQUECER A VOZ DE MINHA MÃE EU NECESSITAVA ESTAR COM ELA PELO MENOS NA VOZ

3- Quando voltou do velório teve muito  medo de esquecer a voz da mãe; sentia necessidade de estar com ela ao menos na voz. Apegou-se aos objetos da mãe. ATÉ HOJE NA GAVETA DA MAMÃE NÃO PUS COISAS MINHAS  E esse armário antes dela vir morar comigo era o meu grande apoio pois nele guardava documentos que eu normalmente vivo achando que estou perdendo. Só lhe foi possível começar a se separar deles quando teve a certeza de poder reproduzir mentalmente a voz da mãe.

4- Uma Digressão Metapsicológica: Eu diria que a voz estava não na fantasia, como atualmente, mas no ego. Como fazia parte de si mesma não podia ser ouvida. Freud falou desse processo quando estudou a paranóia com suas alucinações auditivas. O caminho percorrido para a formação do superego passa primeiro pelas ordens do pai externo; em um segundo tempo este pai é internalizado e as ordens provêm deste pai internalizado; o último passo acontece quando a ordem provém não mais de uma figura de pai mas de seu herdeiro impessoal: o superego. O que era a voz do pai, desaparece, passando a ser parte do ego como superego. Na  alucinação esquizofrênica o superego impessoal readquire sua pessoalidade, voltando a ser voz de alguém. Há uma regressão e o superego abstrato transforma-se em voz concreta. Em Elisa,  aquilo que pertencia ao ego passou a pertencer também ao mundo de fantasia. Quando ela quer, ouve a voz da mãe.

5- Por que a voz da mãe tornou-se ego? Elisa cuidava de forma extremamente dedicada e eficiente da mãe. Mas, por vezes, sentia-se irritada com o trabalho que ela dava. Havia também uma irritação inconsciente da qual Elisa não se dava conta. Pode-se dizer que havia ao mesmo tempo um investimento narcísico na mãe – a mãe como parte do ego – e então a irritação era inconsciente ------ e um investimento objetal na mãe o que permitia sentir uma irritação consciente. Ela sabia que a mãe a incomodava como uma pessoa diferente de si mesma e a irritação era com a mãe. Mas também a mãe como parte narcísica de seu ego não a incomodava como alguém diferente de si mesma, mas como sendo ela mesma e então a irritação ou quaisquer outros sentimentos relacionados eram consigo mesma. Ela é quem era a culpada por se irritar com a mãe pois não haveria nenhum motivo racional para se irritar com ela. A passagem da não-voz (mãe incorporada ao ego) para a voz passível de ser evocada na zona de fantasia é a passagem de um investimento narcísico na mãe para um investimento objetal. Ainda há um investimento narcísico na mãe, mas a passagem do narcísico para o objetal está aberto e pode ser trilhado e está sendo trilhado. Uma passagem que, evidentemente, nunca  será completada, pois a relação  amorosa objetal alimenta-se da relação amorosa narcísica. De qualquer forma, está em curso um processo de separação, um luto-separação ou luto propriamente dito. O movimento é da melancolia para o luto.
A frase inicial que apareceu na mente de Elisa já apontava para uma direção pretendida. A liberdade é azul, e o vestir-se de azul é indicativo de um desejo de luto-separação que ocorreria quando fosse possível e que agora já está acontecendo. Muitos dos objetos da mãe continuam preservados para manter sua lembrança como figura de relação objetal de base narcísica.
Elisa precisa da voz da mãe como uma voz benigna. No seu processo de separação, de luto-separação, predomina o lado amoroso da ambivalência que já de há muito tempo é característico de sua relação com a mãe. E isto porque em Elisa, o aspecto de separação, de diferença predominou sobre o aspecto de identificação, de igualdade, de fusão. Quando há fusão, a raiva da diferença é muito mais violenta do que quando a diferenciação predomina. Isto pode ser exemplificado por um acontecimento terrível e chocante, recentemente ocorrido.  Refiro-me ao assassinato e suicídio da  família Wunder, do qual  falaremos mais adiante.



A LIBERDADE É AZUL
Ao morrerem sua filha e seu marido, Julie passa uma borracha em sua existência passada, e pretende reiniciar uma nova vida sem vínculos. É uma reação defensiva a uma perda destituída de sentido, de uma violência inaudita e  de um sofrimento incomensurável. Ela manda esvaziar o quarto da filha e vender a mansão em que vivia com o marido e a filha. Ela rasga a partitura que estava escrevendo com o marido numa tentativa de anular a vida passada com ele, de anular a sua recordação. O elemento de esperança, de redenção, de volta à vida encontra-se na conservação do candelabro azul do quarto azul da filha. Único objeto, único símbolo que sobrou de toda a tragédia, mas é um sinal de esperança. Se usarmos aqui a teoria freudiana poderemos dizer que desapareceram da vida da fantasia de Julie, o marido e a filha, desta persistindo apenas um indício, um traço. Se desapareceram da vida de fantasia, para onde foram?  Eu diria, ainda baseado em Freud, que se confundiram com o próprio ego de Julie, não podendo ser assim reconhecidos  como pessoas em si. Passaram a fazer parte do ego de Julie e assim desapareceram quase sem deixar traço no mundo de fantasia. Quando Julie sabe da existência de uma amante na vida do marido, a fusão egóica Julie/marido se abala e o marido passa a ter uma existência no mundo de representação, no mundo de fantasia de Julie. A raiva até então inconsciente e que não podia ser elaborada, pôde finalmente ser elaborada e a ambivalência tendeu para a generosidade e a bondade. O marido passou a estar presente na vida de fantasia, assim como a filha na pessoa do embrião que a amante do marido carregava no ventre. Saímos do mundo indiferenciado egóico para o mundo diferenciado da fantasia. Julie oferece então a mansão para a amante e a filha viverem, e retoma a sua vida; reconcilia-se com o marido, ajudando a terminar, com o auxílio de  um amigo, a partitura musical que ficara inacabada. Sai da esterilidade para uma vida  afetiva. Sai de um “tanto faz”, de um sentimento de futilidade, para um sentimento de vida. Podemos dizer que a natureza de sua depressão e de seu luto mudou: passou de uma depressão vazia, de um luto de fixação, para uma depressão elaborativa, um luto de separação.



FERNANDA
Casou-se  sem amor e teve um filho a quem dedicou um incomensurável afeto carregado de expectativas. Este filho não correspondeu às expectativas de Fernanda. Fusionada que estava a ele, a decepção foi enorme e a raiva ora ficava reprimida, ora se manifestava, levando a discussões de grande intensidade. Podemos dizer que havia uma situação de ambivalência onde o componente agressivo narcísico tinha grande peso. Este filho morreu já adulto, e a dor sentida pela mãe foi imensa, ilimitada. Ela nada mais fazia na vida a não ser sentir dor. Uma dor de tal intensidade que a diferenciação físico/psíquico desapareceu. Torturava-se com pensamentos de ter sido uma péssima mãe, de não ter agido com eficiência e presteza por ocasião de sua agonia e morte, de que agora a vida não lhe interessava, que só lhe restava morrer, que não ia se suicidar, mas deixar-se-ia morrer, de que ela não se continuaria na pessoa do filho, o que significava que desapareceria ao morrer o que tirava o sentido da vida,. Passava a maior parte do tempo na cama sentindo a sua dor: deixou os livros, as músicas, os filmes, de tudo que gostava. Só excepcionalmente saia de sua casa, a não ser que se tratasse de compromisso profissional. Gostava, porém de receber visitas de pessoas amigas, desde que fossem realmente amigas e poucas. Nessas ocasiões nada falava, apenas desfrutava da companhia dos amigos. Detestava ouvir as frases padrão de consolo. Queria sentir a dor e para ela nada mais havia nem haveria no mundo a não ser a dor. E, no entanto, persistiu uma migalha de instinto de vida que fazia com que ela não faltasse no trabalho, que a fez procurar análise e que manteve minimamente em  funcionamento a casa. Creio que podemos dizer que se trata de uma relação narcísica onde ela se confunde de tal maneira com o filho que  o destino do filho – a morte -  tem de ser o seu destino. Também a agressividade da relação, trouxe para a  mãe uma carga de culpa que a manteve fixada  na  figura  de filho à maneira de  uma neurose   traumática. A repetição mental e afetiva das situações de agressividade não abriram as  fronteiras da  fantasia; as situações imaginadas e  sentidas não fluíam em direção a uma compreensão psicológica ou filosófica mais ampla, mantendo Fernanda atada às memórias sem possibilidade de iniciar  um processo de libertação que daria acesso à vida que tinha perdido. Embora a representação do filho não estivesse oculta, não podemos dizer que estivesse na zona de fantasia. Embora representada, a figura do filho estava fortemente amarrado à zona narcísica, à zona egóica da mãe, sendo lá conservado vivo para um fantasioso e impossível comportamento alternativo; talvez mais que na perda do filho, ou concomitante a isso, a mãe pensava obsessivamente no que ela tinha falhado, deslocando o acento do objetal para o narcísico. Fixada nela mesma, no seu comportamento, teve dificuldade em elaborar o luto do filho, em ligar-se exclusivamente à sua perda. Só após aproximadamente dois anos após a morte do filho, e com a ajuda de uma análise, a figura do filho está começando a se deslocar da zona do ego, da zona narcísica, para o zona objetal, zona da fantasia.




FAMÍLIA WUNDER: ASSASSINATOS E SUICÍDIO
Que relação este acontecimento chocante tem a ver com luto? Eduardo lembrou-me que a transformação sofrida pela nossa querida cidade do Rio de Janeiro deixou um travo amargo de  luto que temos de elaborar. Sérgio lembrou-me que também fazemos luto por identificação e que o desaparecimento brutal da família de Waldo de Carvalho Wunder deixou-nos a todos enlutados. Acredito que mais que enlutados, deixou-nos assustados pelo estranho/familiar potencial humano para a destrutividade, e mais  assustados ainda por ter  acontecido com uma família de uma camada social com a  qual nos identificamos. Podemos pensar em luto pela tranquilidade perdida, pela perda de um Rio de Janeiro menos agressivo; podemos também nos identificar com os protagonistas e chorar a morte deles. Mas não é por essas razões que apresento este caso. É porque ele ilustra com muita clareza a questão do narcisismo. E a compreensão do narcisismo é  fundamental para a questão do luto e melancolia.

10- No luto perde-se o objeto externo e na melancolia perde-se uma parte do eu. Por quê? Porque a melancolia depende de uma relação narcísica do sujeito com o seu objeto. Na verdade o objeto não é reconhecido como tal sendo vivido como parte de si mesmo. Isto, em parte, explica a tragédia da Barra da Tijuca. Mulher e filhas eram dependências de Waldo e como Waldo, deveriam morrer. Mas há mais um aspecto na melancolia. A relação de objeto sendo narcísica é também extremadamente ambivalente, isto é, existe amor e ódio pelo objeto que ao mesmo tempo é parte de si mesmo, e ao mesmo tempo teima em ser diferente do si mesmo. Há uma tentativa de ser igual para manter a ilusão narcísica de amor do objeto, pois estamos no campo narcísico do amor de objeto. Pegando novamente o exemplo do engenheiro. Por um lado ele queria dar à família todos os objetos desejados, e isto, não só pela solicitação da família, mas também por um ideal de ego narcísico (ego ideal) em que o sucesso e a riqueza eram o objetivo. Por outro lado se sentia pressionado a dar algo que já não tinha condições de dar, pressionado por ele mesmo que desejava manter o status e pressionado pela família que também queria continuar usufruindo  de objetos caros e socialmente valorizados. Essa pressão de si mesmo e da família alimentava o seu ódio de si e de seus familiares. Temos aí a característica ambivalência das relações narcísicas vistas de forma purificada; ama-se o igual e odeia-se o diferente. O igual é aquilo que corresponde a um eu ideal e o diferente é aquilo que está além da capacidade do eu ideal. O outro não é um outro mas é este mesmo eu ideal. Freud nos fala que a perda de objeto numa relação narcísica faz com que a libido recue até o ego, diferentemente da perda numa relação objetal em que a libido recua até as fantasias, não indo até o ego. Se a esposa  e as filhas estivessem investidas de libido objetal elas estariam no campo da fantasia de Waldo e não no campo de seu ego. Seriam então vistas como entidades diferentes dele próprio e suas vidas seriam preservadas, pois não estariam organicamente, profundamente, egoicamente ligadas a ele. Mas, infelizmente, elas eram parte de seu ego e diante da frustração que foi a perda de status que não podia ser aceita por uma personalidade narcísica, houve um retorno do investimento não à fantasia, mas ao ego, onde se alojaram os membros de sua família restrita. Diante da humilhação só restava o suicídio, a morte do ego, e no ego de Waldo estavam mulher e filhas. Esta é uma situação melancólica e não uma situação de luto. Na melancolia o que se perde é uma parte de si mesmo. A perda de status era uma parte de si mesmo, sendo que neste si mesmo estavam incluídas mulher e filhas. Se a situação fosse de investimento objetal, a perda de status seria uma perda não de si mesmo, mas de um objeto externo e não haveria a tragédia.

Vamos nos deter mais um pouco em cima do status. O status era um investimento narcísico e não objetal. Isto é, no status estava lançado o seu próprio ego. A sua relação com o status era uma relação narcísica de maneira que quando ele perde o status ele perde parte de si mesmo. Se fosse uma relação objetal ele não teria perdido uma parte de si mesmo, mas um objeto externo e faria não uma melancolia que o levou à morte, mas um luto que lhe permitiria continuar vivendo.
         Da mesma maneira seu investimento na esposa e filhas era narcísico e não objetal. Elas eram objetos narcísicos, isto é, partes de si mesmo, e não objetos de sua fantasia, onde elas estariam dentro de si mesmo não como parte do ego, mas como parte da fantasia. Se elas eram parte de seu ego, era muito natural que morressem com o Waldo pois elas eram o próprio Waldo. Waldo se relacionava ambivalentemente consigo mesmo. Amava a si mesmo enquanto correspondia ao seu ego ideal, e se odiava quando afastava-se do ego ideal. É a ambivalência extremada da relação narcísica e da melancolia. Uma parte de si mesmo exigia manter o status. Outra parte de si mesmo odiava-se por não conseguir manter o status. A mãe e a filha, dentro do jogo dinâmico da família, exigiam concretamente a manutenção de um status já impossível. Surge então um ódio narcísico de si mesmo, sendo que neste si mesmo está incluído não só o Waldo exigente consigo, mas a filha e mãe também exigentes. A ambivalência sai de seu ponto de relativo equilíbrio e o ódio predomina sobre o amor. Waldo mata a si mesmo inúmeras vezes com inúmeros tiros, dando vazão a este ódio de uma parte de si colocado na mulher, nas filhas e nele mesmo. Daí o número excessivo de tiros. São indicadores do ódio. E, no conjunto, indicadores de uma relação narcísica que levou ao suicídio/assassinato, mas que, em outras circunstâncias (uma perda de um dos membros da família), levaria à melancolia, isto é, a uma fixação, a uma culpa, a um sentimento de perda de parte de si, à auto-desvalorização, ao auto-ataque, à ruminação melancólica. A melancolia sendo uma perda do ego, e estando o ego intimamente ligado ao corpo (o ego é basicamente um ego corporal) compreende-se o aparecimento de transtornos e doenças psicossomáticas. Se quisermos especular um pouco podemos pensar que em sendo a melancolia uma perda  de parte de si mesmo, corresponde, no plano das neuroses atuais a neurastenia que segundo Freud, é uma perda de energia advinda de um excesso de masturbação. Seria uma doença orgânica por deficiência de libido e não por excesso como é o caso da hipocondria ou da neurose de angústia (a energia sexual excessiva investindo órgãos do corpo).



LUTO E PSICOSSOMÁTICA – UMA EXTENSÃO DA  METAPSICOLOGIA FREUDIANA  DA MELANCOLIA.

Comecemos com a neurose de angústia, com a hipocondria e com a neurastenia, três neuroses atuais na psicopatologia freudiana. Na neurose de angústia há um excesso de energia, de libido que se descarrega no corpo provocando angústia. Na hipocondria a perda do objeto numa relação narcísica faz com que a libido retorne ao  ego produzindo sintomas psíquicos como paranóia e idéias de  grandeza. Esta é uma forma de dispersar  o excesso de libido que invade o ego a partir da frustração. Se esses recursos não são usados, então o excesso de libido se descarrega no corpo, erotizando algum ou alguns de seus órgãos e produzindo hipocondria. Já na neurastenia os sintomas não advêm do excesso de libido, mas de uma depleção. O excesso de masturbação diminui a quantidade de energia somática disponível, e o soma sofre as conseqüências dessa depleção adoecendo, pois ele precisa de um mínimo de libido para poder funcionar adequadamente.
Na perda melancólica há uma depleção no ego. É uma parte do ego que se perde. Podemos, usando o raciocínio de Freud, hipotetizar que essa depleção terá como conseqüência um transtorno orgânico. Eu iria até mais adiante. Sendo o ego basicamente corporal teríamos alguma doença orgânica: um câncer, uma úlcera péptica, uma tireotoxicose, diabete, leucemia, etc. (Ver “Concepção psicossomática – Visão Atual) de Júlio de Mello Filho.)
Podemos hipotetizar que o processo de luto, quando a relação libidinal é objetal e portanto o objeto perdido fica na zona de fantasia, também provoca transtornos somáticos, porém mais passageiros e menos graves, pois aqui não se trata de ego corporal mas de objetos que circulam na fantasia, relativamente afastados do âmbito do ego.

Por fim é preciso que se diga que há sempre elementos narcísicos e objetais na relação amorosa, isto é, a pessoa amada é sentida paradoxalmente como parte de si mesma e ao mesmo tempo como pessoa independente. Uma afecção somática mais ou menos grave, mais permanente ou mais passageira, dependerá da pessoa estar fazendo ou um luto ou uma melancolia. Sempre haverá um balanço entre investimentos narcísicos e objetais e, portanto entre luto e melancolia. Daí também a grande variedade de transtornos e doenças psicossomáticos, sua gravidade e permanência. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário