A MASSA, A MULTIDÃO E A PSICANÁLISE

As manifestações de rua de junho de 2013 deram vida aos conceitos de massa e multidão de Antonio Negri.
O exame da transformação de massa em multidão pode dar subsídios ao conhecimento da subjetividade de nossa época e assim nos ajudar na nossa labuta.
A massa age em uníssono. Não há singularidade. Todos seguem o mesmo modelo que é o modelo do líder e de sua teoria.
A multidão é composta de singularidades. Cada pessoa da massa tem as suas reivindicações, seus pensamentos e sentimentos singulares.
Isto tem a ver com a mudança de paradigma. Passamos da verticalidade para a horizontalidade. Na verticalidade esperamos que um líder nos guie. Na horizontalidade cada um é seu próprio guia e se por acaso surge uma liderança apropriada, as questões individuais são discutidas a partir das dúvidas da pessoa e não a partir das ideias do líder.
Esta nova subjetividade deverá orientar o psicanalista na sua prática clínica. O antigo sujeito da verticalidade aceitava e colocava o analista em uma posição hierárquica superior, em um território sagrado do qual estava excluído. O analista era uma espécie de habitante do Olimpo e tudo se passava segundo os ditames analíticos. Era visível o constrangimento do analista e do analisando quando por acaso se encontravam fora do consultório, pois a Terra, a rua, a cidade nada tinham a ver com o estatuto do analista. O analisando esperava que a sua verdade fosse vista e dita pelo analista, esperava ser orientado como um discípulo. O analisando fazia parte dos anônimos que almejavam se individualizar através do carisma do analista líder. Uma relação de idealização. Hoje encontramos cada vez mais frequentemente o Homem Horizontal que percebe o analista como um ser humano semelhante a si. Este homem horizontal não aceita ser doutrinado; sua expectativa de relação igualitária faz com que ele espere que o analista coloque as cartas na mesa, isto é, que se apresente como o ser humano que é, sem usar uma máscara de superioridade. O acolhimento do analista não será nem paterno nem materno, mas sim fraterno. Isto significa expor-se, expor os seus sentimentos verdadeiros e não escondê-los. Ao lado da atividade propriamente interpretativa referida aos traumas da infância ( e também aos atuais) trabalha-se a relação de forças e fantasias intersubjetivas, procurando-se compreender a dinâmica da díade.   A interação intersubjetiva, quando se revelam e se trocam afetos e fantasias, passa a ser um elemento primordial da prática psicanalítica. Neste modo de operar a fluidez e espontaneidade da horizontalidade ocupam o posto antes petrificado pela verticalidade do conhecimento, transformando o errar em aprender.

                                                       Nahman Armony       

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